Seminário estadual de Recaatingamento evidencia necessidade de redistribuição de terras no Semiárido baiano

19 de May / 2018 às 19h00 | Variadas

Aconteceu na cidade de Senhor do Bonfim (BA), entre os dias 17 e 18 de maio, o Seminário estadual sobre Recaatingamento. O debate busca reforçar para toda sociedade a urgência em recuperar, conservar e preservar a Caatinga, Bioma que predomina no Semiárido brasileiro. Realizado pelo Governo do Estado da Bahia, o evento é aberto ao público em geral e reúne representantes dos poderes executivos e legislativos municipais e estadual, organizações da sociedade civil, agricultores/as familiares, educadores/as e pesquisadores/as.

Durante a abertura do seminário, o secretário de Desenvolvimento Rural da Bahia, Jerônimo Rodrigues, disse que o governo hoje busca tratar a Caatinga como um tema mobilizador, uma vez que temáticas como fortalecimento das identidades, educação contextualizada, economia, estão diretamente ligadas a valorização do Bioma. Para o secretário, o governo baiano não está pautando o cuidado com a Caatinga apenas por obrigação, mas por compreender esta necessidade e que não se se trata de uma construção governamental isolada mas de uma relação indispensável de parceria com outros atores.

Um dos painéis da programação apresentou um "Panorama das experiências da ASA com Recaatingamento", destacando o pioneirismo do Irpaa, instituição que inclusive difundiu o termo Recaatingamento em substituição à Reflorestamento que é normalmente utilizado. José Moacir dos Santos, colaborador do Irpaa e presidente do Conselho Estadual de Segurança Alimentar, mostrou como a entidade vem realizando esse trabalho desde 2009 em parceria com as comunidades Fundo de Pasto do norte da Bahia.

Moacir aponta um desafio que precede a ação do Recaatingamento: o acesso à terra em tamanho apropriado para as comunidades. A proposta do Recaatingamento exige isolamento de área para recuperação e/ou preservação, porém a maior parte das comunidades tradicionais não dispõe de tamanho suficiente para garantir sequer as atividades extrativistas que garantem o sustento das famílias. Para o Irpaa, é preciso que o Estado defina o uso da terra, uma vez que a realidade é de maior facilidade de acesso para setores do agronegócio. "Qual o projeto que o Estado tem para a Caatinga e o Cerrado?", questionou Moacir.

Ao apresentar experiências de "Recaatingamento com comunidades agropastoris e extrativistas", Valdivino Rodrigues, da Articulação Estadual de Fundo e Fecho de Pasto, reforçou essa preocupação que já vem sendo pautada pela sociedade civil. "É importante o processo de Recaatingamento mas é necessário também observar a questão fundiária, o tamanho das áreas, a dinâmica da comunidade utilizar essas áreas. Tem comunidade que é impossível fazer Recaatingamento pela quantidade de terra que tem. Nossa preocupação que estamos trazendo nesse seminário é essa". Valdivino acrescenta ainda que se deve ter a consciência de que além de recuperar, é preciso pensar em conservar.

Morador da comunidade de Lagoinha, município de Casa Nova, Ricardo Silva, é um dos agricultores presentes no seminário. Ele já vivencia a experiência do Recaatingamento em sua comunidade e ressalta benefícios como a recuperação da área e a consciência ambiental das pessoas. O agricultor explica que devido a parceria das instituições de apoio que desenvolvem assessoria técnica em sua comunidade, "hoje o pessoal abraçou mesmo a luta do Recaatingamento, ninguém queima mais, não desmata (...) e agora com o apoio do governo a gente fica mais incentivado a proteger a nossa área", disse.

Interessado também na discussão, o diretor presidente da Rede Pintadas, Elias Rios, valoriza a iniciativa do governo de pautar o Recaatingamento, ressaltando que esta é uma demanda das organizações sociais que agora conta com investimentos públicos indispensáveis.

Responsável pelo Painel "O Plano Estadual de Convivência com o Semiárido", a consultora da Casa Civil, Tatiana Scalco, destaca que na Bahia vem sendo construídas políticas contra hegemônicas de Convivência com o Semiárido. Dos 417 municípios baianos, 278 estão na região semiárida, o que representa metade da população do estado, legitimando a necessidade de investimentos em políticas apropriadas.

Desde 2012, representantes de diversos segmentos do estado vem construindo passos na consolidação da Convivência com o Semiárido como política de Estado e não apenas de governo. Em 2017 o governador Rui Costa sancionou a Lei 13.572, a qual prevê inclusive a criação do Fórum Estadual de Convivência com o Semiárido, órgão responsável pela elaboração do Plano Estadual.

O Fórum foi criado em janeiro deste ano e vem pautando a necessidade de integração e fortalecimento das políticas, conforme pontuou Tatiana Scalco ao mencionar alguns avanços relacionados, sobretudo, a investimentos em infra estruturas hídricas apropriadas, energia sustentável, tecnologias viáveis para região, etc.

A deputada estadual Fátima Nunes (PT/BA), foi relatora do Projeto de Lei da Convivência com o Semiárido e reconhece, contudo, a urgência em explorar um tema histórico na Bahia e no Brasil: a redistribuição de terras. Para a parlamentar, a concentração da terra é uma herança da colonização portuguesa e para concretizar mudanças nesse setor é preciso que a sociedade eleja parlamentares comprometidos/as em alterar a lei de terras existente.

"Para alterar uma lei, que venha de fato se transformar numa política pública de acesso à terra, de regulamentação dos Fundos e Fechos de Pastos, nós vamos precisar ter um Congresso Nacional comprometido com isso, como também a nível do estado da Bahia", provoca. Ela cita ainda a importância da mobilização popular, acreditando que a pressão social é fundamental para garantir essas mudanças estruturais.

Ascom Irpaa

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