Com desemprego em alta, juazeirenses e petrolinenses aproveitam para "fazer trabalhos de segurar bandeiras" nas eleições e driblar crise

15 de Sep / 2022 às 16h30 | Eleições

Neste período de campanha, centenas de vagas de trabalhos temporários surgem nos comitês eleitorais de todo o país. Inúmeros trabalhadores são contratados para distribuir adesivos para carros, impondo faixas e bandeiras dos candidatos, entregando panfletos e santinhos, atuando e realizando o trabalho de propaganda política.

Durante dois dias, na segunda (12) e terça (13), a reportagem da REDEGN, esteve nas ruas e avenidas de Juazeiro e Petrolina conversando com pessoas que carregam as bandeiras das campanhas eleitorais dos candidados.

A reportagem constatou que a grande maioria dos casos, o local de trabalho destas pessoas é à beira de ruas e esquinas, ficando expostos, durante todo o dia, ao sol, ao perigo e estresse do trânsito, em pé durante toda sua jornada de trabalho e na maioria das vezes, sem ter um local adequado para se alimentar e fazer sua higiene pessoal, impossibilitado inclusive, de tomar água durante o trabalho.

De acordo com a  Lei 9.504/97 (que dispõe sobre as normas para as eleições) estabelece, no art. 100, que a contratação de pessoal para prestação de serviços nas campanhas eleitorais, não gera vínculo empregatício com o candidato ou partido contratantes.

Sem dinheiro e sem auxilio emergencial, trabalhar na campanha eleitoral é a única fonte de renda neste mês de setembro, diz, onstrangida uma mulher de 25 anos (que a reportagem prefere não identificar). Ela recebe entre R$20 a R$ 40,00 reais por dia para empunhar uma bandeiras durante mais de 5 horas e sem direito a alimentação e ou vale transporte.

A reportagem constatou que as coordenações das campanhas não dispõe de protetor e água para os que as pessoas realizarem o trabalho. No dia que s REDEGN acompanhou no final da tarde uma adesivagem, na orla Juazeiro,  presenciou um dos carregadores de bandeira "solicitar autorização para ir fazer xixi na beira do rio São Francisco".

A maioria das pessoas que a REDEGN ouviu, estão desempregadas e a campanha eleitoral é mais um paliativo de curtissimo prazo para ajudar na renda familiar. "É cansativo mas eu tenho que ter algum dinheiro, mesmo que mínimo para garantir alimentação", afirma uma outra carregadora de bandeira.

Ouvido pela REDEGN um coordenador de campanha disse que "ali estavam todos na condição de voluntários. Apesar de existir um fundo partidário para pagar despesas do candidato,, todos trabalham de forma voluntária". A REDEGN prefere também não citar o nome do coodenador e coligação partidária.

Desempregado, um homem de 40 anos disse que "só restou ser cabo eleitoral, bico de um candidato a deputado". "Na verdade é tudo muito humilhante", declarou.

O professor Harisson Souza, sociólogo e doutor em Geografia (UFPE), associa esse cenário com a situação de desemprego e vulnerabilidade. Essas funções caracterizam militância. "Eu lembro que em outros tempos as bandeiras eram bem presentes e atuantes nas campanhas. Havia um certo grau de fidelidade ao candidato e as propostas defendidas. Hoje as motivações são mais diversas, não necessariamente ideológicas", avalia Harrison.

Solicitado pela REDEGN o professor avaliou a situação apresentada pela reportagem. Confira:

"Levantar bandeira é um gesto de militância, o que sugere ao indivíduo certo grau de afetividade e identidade com as causas do engajamento articuladas com os seus objetivos individuais. É mais comum que este movimento ocorra em espaços tradicionais como organizações sociais, movimento estudantil e na própria política partidária.

As experiências obtidas pelos agentes envolvidos nesse contexto incidem em outros aspectos da vida. Porém, cabe ressaltar que existe um leque de motivações que os levam a atuar nessas ações coletivas, sendo complexo ponderar a instigação desses atores. Para isso é necessário aferir quais sentidos são conferidos a eles nas inter-relações entre essas mobilizações e os seus propósitos individualizados.

A coleta de informações da reportagem mostra que o atual cenário de crise econômica é um aspecto relevante na decisão dos trabalhadores em ingressar na campanha eleitoral. Parte das motivações são decorrentes do desemprego e da crescente vulnerabilidade que os expõe às fragilidades sociais. Os últimos indicadores do IBGE mostram que são 10,1 milhões de brasileiros desempregados. Outro dado relevante é o de Insegurança alimentar, cujo levantamento foi feito pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (PENSSAN). Os relatórios mostram que na Bahia 11,4% dos baianos apresentam grave insegurança alimentar. Em Pernambuco este indicador chega a 22,2% da população.

Em alguns dos casos ouvidos pela reportagem as condicionantes da fome e do desemprego são proeminentes. Indo além, caberia averiguar se a escolha por trabalhar na campanha de determinados candidatos teve algum critério de afinidade ideológica ou outras indicações. Nesse sentido, a reportagem contribui com as narrativas da conjuntura e as possibilidades de aprofundamento do tema".

Harisson Souza – é professor, pesquisador, sociólogo e doutor em Geografia (UFPE).

Redação redeGN Texto Ney Vital Foto Ilustrativa

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