SEGREDOS SOBRE O CANGACEIRO LAMPIÃO!

25 de Jan / 2018 às 23h00 | Espaço do Leitor

Não gostaria de cufar (morrer) – na língua Iorubá - no peito, fatos verídicos do terror do sertão nordestino. Antes, porém, para os neófitos na seita animista, explico quando se diz estar de corpo fechado e corpo aberto. Fechado é mantê-lo imune a perigos a exemplo de tiro, facada, graças a amuletos e orações bem feitos; enquanto o corpo aberto, a pessoa se descuida das obrigações, ficando vulnerável ao mau olhado, olho gordo e ações violentas, como lesões corporais, acidentes de veículo, podendo perder a vida em situações adversas.

Aconselha-se, portanto, que o indivíduo ao levantar-se que faça o sinal da cruz, não se esquecendo de despachar a rua, ao sair de casa, jogando água em três direções, pronunciando as palavras: agô..! agô..! agô..!  Que quer dizer licença! Assim se procedendo estará com os caminhos abertos, livres das ações do tinhoso, que anda solto pelo tempo afora com suas maldições generalizadas.

Meu querido pai – que se encontra na segunda dimensão – Narciso Dias de Andrade assistiu ao triste período sanguinário pelas caatingas do Nordeste, tendo como pivô, agente principal, Virgulino Ferreira da Silva, vulgo Lampião, natural de Serra Talhada, Pernambuco.

O banditismo durou quarenta anos, sendo Lampião morto em 1938, juntamente com sua mulher Maria Bonita, após o bando ser cercado na fazenda Angico, hoje, Poço Redondo, Sergipe. O terror do Nordeste era denominado de “ O Senhor do Sertão” e “ O Rei do Cangaço.”

Meu saudoso pai comandava uma Volante que perseguia o banditismo, organização macabra que escrevera uma página degradante, cruel em nossa história.

Sargento Narciso Andrade, meu genitor, casou-se com uma sertaneja natural da antiga cidade de Cumbe - (que significa cachaça) – atual Euclides da Cunha, bem próxima da cidade Canudos, a qual fora no passado, outro teatro de operações de guerra que perdurou muitos anos, graças a coragem e estratégia do líder religioso Antônio Vicente Mendes Maciel, conhecido na História do Brasil como Antônio Conselheiro, natural de Quixeramobim – CE.

Como se vê, a região de Cumbe era repleta de conflitos sociais, derramamento de sangue, causando muitas baixas entre fanáticos religiosos e as forças legalistas.

 O autor desta crônica, quando estudava o primário na cidade de Alagoinhas – Bahia, foi crescendo e sempre curioso, atento para saber da saga do “Rei do Cangaço.”

O tenente José Rufino ou Zé Rufino, como era mais conhecido, comandante também da Força Volante, natural da cidade de Jeremoabo, neste estado, por vezes ia a casa dos meus pais, na Rua Barão de Cotegipe, na cidade de Alagoinhas. Casos e mais casos referentes a Lampião não faltavam, e, eu botava os ouvidos em alerta; logo, era bem informado de vários episódios do cangaço nordestino.

O combatente Zé Rufino foi quem matou Cristiano da Silva Cleto, o Corisco, marido da cangaceira Sérgia Ribeiro da Silva, (Dadá), que fora alvejada com um tiro de fuzil na perna por um soldado baiano, o qual me contou no Quartel dos Aflitos, em Salvador, sobre o tiroteio, em que a cangaceira valente fora lesionada.

Após as explanações citadas, passo a revelar o segredo histórico que se verificou no curso da perseguição ao bandoleiro das terras nordestinas, que ceifou muitas vidas humanas sem dó e piedade.

Um segredo que envolve lutas e a Força da Magia dos Voduns, Força Divina, Espírito. É usada na Nação Jeje para designar os seus deuses.

O sargento Narciso - meu pai - era filho de minha avó biológica, Maria Romana Moreira – (Mãe Romaninha de Possú – Gaiaku Romaninha), sacerdotisa do Terreiro do Bogum ou Zoogodô Bogum Malê Rundó de tradição Jeje – Mahi, natural de Cchoeira – BA. Falecera com cento e quinze anos de idade, em 1956, na cidade do Salvador, estaria, hoje, com 177anos. Romaninha, na seita afro era avó do notável cantor e compositor cachoeirano Mateus Aleluia e do personagem principal do romance de minha lavra, intitulado “Por que Vigário não Casou Lolita Karoline?” (Athirson da Felicidade Pereira). Este neto, que oculto o seu nome verdadeiro, pertence hoje à Diocese de Salvador, sendo um excelente representante da Igreja Católica.

 À frente da Volante, sargento Narciso Andrade, estando em um desfiladeiro – passagem estreita entre montanhas - nas estradas de Monte Santo-BA, no comando de dezenove soldados, todos montados em animal, foi quando Corisco o mirou na cabeça, com o fuzil, entretanto foi repelido por Lampião: nesse não se pode atirar! Deixando todos do bando sem saber da razão inusitada!

 De outra feita, no antigo Cumbe, uma Volante sob o seu comando, pronta para se deslocar à cidade de Santo Antônio das Queimadas, na Bahia, chegava uma contraordem para substituí-lo o que lhe deixara insatisfeito, pois, não aceitava as malvadezas do terror do sertão e que preferia combatê-lo em um fogo. Concluiu, entretanto, que sua substituição de repente fora coisa sobrenatural, espiritual, graças a magia dos Voduns.

A Volante com o substituto seguiu para a cidade de Queimadas, onde houvera a chacina de sete soldados, sendo decapitados e a cabeça posta em varas, fato ocorrido na tarde de 22 de dezembro de 1929, em praça pública, defronte da delegacia de polícia, tendo sido poupado da matança o sargento Evaristo a pedido de uma moradora; mas, este, não se livrou de ser colocado no bando e obrigado a sair pelas ruas, humilhado.

Esses detalhes foram narrados pelo bandido Volta Seca, ao meu pai, quando aquele se encontrava sentenciado na Penitenciária do Engenho da Conceição, em Salvador, onde pegou 145 anos de prisão, reduzida a pena para 30, finalmente para 20 anos, havendo-lhe concedido o perdão em 1954 pelo presidente Getúlio Vargas.

Não resta a menor dúvida que o “O Rei do Cangaço” respeitava as deidades de Romaninha do Bogum com suas forças espirituais. Logo, “O Rei do Cangaço” não queria ofender o filho da sacerdotisa cachoeirana.

Talvez Lampião tinha o poder de orações e amuletos dados por (Mãe Romaninha do Passú – Gaiaku Romaninha), pois, por 40 anos manteve ser corpo fechado; entretanto, acredita-se que ele se descuidara, morrendo com a mulher, estando de corpo aberto, visto que -  segundo se falou na época – havia transado com a cangaceira, estando ela no ciclo menstrual, não se preocupando em seguida com o devido asseio, tomando banho, ficando, portanto, de corpo aberto, vulnerável. Consultado o Ifá - Deus da adivinhação – no jogo dos búzios se confirmou que o bandoleiro estava sujeito a perigos, desprotegido espiritualmente. Após se manter relação sexual se faz necessário que se tenha o corpo limpo imediatamente, livrando-se das forças demoníacas e de emboscadas!

Geraldo Dias de Andrade é Cel.PM\RR – Escritor – Bel. em Direito – Membro da ABI\Seccional Norte – Cronista – Membro da Academia Juazeirense de Letras.

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