Existem recursos para investimento em saúde, mas são mal distribuídos, afirma especialista

Primeiro editorial do Conselho do British Medical Journal (BMJ) para a América Latina a respeito das prioridades e dos desafios para melhorar a saúde e a equidade na região. Deisy Ventura, professora da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da Universidade de São Paulo (USP), do Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário (Cepedisa) e vice-diretora do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP e membra do conselho, comenta os objetivos da publicação para amenizar as desigualdades no continente americano.

De acordo com a docente, a América Latina passou recentemente por períodos de grande instabilidade política, o que acentuou as desigualdades socioeconômicas. Ela destaca, contudo, a atuação do Brasil no início da epidemia do HIV como referência internacional no desenvolvimento de medidas de imunização e aponta o objetivo dos Conselho Sul-Americano em tentar quebrar essa visão mundial de que os países latino-americanos precisam ser os alvos de ajuda financeira internacional.

“Nós temos o SUS, que é uma referência internacional e representa a oportunidade de que exista um direito à saúde garantido na Constituição e uma estrutura que, mesmo com dificuldades, tem o dever legal de prestar assistência à população. Então, a gente quis transmitir essa ideia de olhar as nossas experiências positivas de agentes comunitários da saúde, o trabalho que é feito em diversas regiões aqui no subcontinente e também no Caribe”, conta.

DIFICULDADES: Conforme Deisy, mesmo que o objetivo do Conselho seja fomentar a discussão acerca das experiências positivas de saúde na América Latina, o relatório também reconhece as dificuldades enfrentadas pelo continente, as quais foram evidenciadas durante a pandemia de covid-19. Segundo ela, os problemas de falta de acesso da população a insumos e medicamentos devido aos altos preços são resultados de falhas de distribuição e organização dos governos. “Os recursos existem, mas eles estão mal distribuídos, então nós também queremos mostrar que alguns governos não dão prioridade para a saúde. Nós temos dificuldades na América Latina, mas também temos muitos pontos positivos que alguns outros países até imitam”, esclarece.

A professora conta que o Conselho do BMJ busca, além da produção crítica que aponta os pontos negativos da atuação dos governos, mostrar em quais aspectos o campo da saúde precisa ser aprimorado. Ela destaca também a expectativa do BMJ em aumentar a participação da América Latina na divulgação pelas grandes revistas internacionais especializadas em saúde e ciência.

“Nós sabemos que não é um processo fácil em razão da hegemonia do mundo desenvolvido, mas temos muita esperança e esperamos que esse conselho aumente a produção da América Latina dentro das revistas de grande impacto. É muito importante destacar a cooperação entre os países para tentar encarar os desafios, os quais são muitos, como podemos ver no editorial”, finaliza.

Jornal da USP