Projeto em feiras de Brasília valoriza a tradição nordestina da cantoria de viola

As notas musicais tocadas nas violas de Chico de Assis e João Santana ecoam pelos corredores cheios da Feira do Guarapari, em Ceilândia Sul. O improviso dos versos entoados durante as apresentações diverte e alegra feirantes e clientes. Muitos dos que passam pelo palco param por alguns minutos para apreciar o show gratuito, promovido por meio do projeto cultural Repente na Feira.

A ideia de montar as apresentações foi do repentista Chico de Assis, 55 anos, que contou com incentivo do Fundo de Apoio à Cultura (FAC), da Secretaria de Cultura do Distrito Federal. Natural do Rio Grande do Norte e repentista há 35 anos, Chico invariavelmente conta com a parceria de João nos shows, mas também convida outros artistas, como Donzílio Luiz de Oliveira e Valdenor de Almeida, para integrarem o espetáculo.

O repentista explica que, diferentemente do que acontece nas feiras da Região Nordeste, o público do Distrito Federal  “não está habituado com esse tipo de apresentação. A gente tenta conquistar quem não tem o hábito de escutar o repente”, explica. Entre uma compra e outra, os frequentadores do local paravam em frente ao pequeno palco para apreciar os cantadores.

Entre eles, o educador físico João Henrique Souza, 28, gostou da novidade. “Achei a música muito legal e expressiva, além de trazer cultura para todos, valoriza as raízes dos moradores nordestinos”, disse e acrescentou ser favorável a eventos semelhantes. “Tudo o que a população quer é uma boa diversão próxima às suas casas, para espairecer a cabeça”.

Frequentador assíduo de feiras, o aposentado Edivaldo Delfino, 74, disse que veio de Pernambuco para a capital federal em 1971. “Quando ouvi a música, tive que parar para assistir. A apresentação traz mais um pouco da cultura nordestina para cá”, defende.

Satisfeito com a receptividade do público, o violeiro João Santana comentou que o projeto oferece oportunidade de acesso à cultura, tanto a quem não tem tempo quanto a quem não pode pagar por shows. “A gente encontra pessoas que se identificam com o estilo, que sentem saudades de sua raízes”, salientou.

Esse foi o sentimento do cearense Raimundo Romano dos Santos, 67. “La no meu Ceará, tem cantador demais, ao ouvir me traz uma nostalgia. É o tipo de música que eu escuto em casa, então eu acho bom demais”, assegura o aposentado.

Para a professora Ana Carolina Souza Silva, 27, a cultura nordestina deve ser incentivada. Com o filho Jorge, 1 ano, no colo ela achou a apresentação fantástica. “Estamos falando de Ceilândia, uma cidade construída por muitos nordestinos. O repente aproxima os moradores e interage com o ambiente de outra forma”, opinou. “Deveriam ter mais ações como essas e também expandir, trazendo o teatro, o mamulengo e outras manifestações culturais. Os trabalhadores estão aqui (na feira) para trabalhar e não têm muito tempo pra consumir cultura”, concluiu.

“Eu amo o ambiente da feira e lidar com as pessoas, também. A música traz um diferencial para o dia a dia do lugar, animando e deixando tudo divertido. Para mim, poderia ter show todas as semanas”, pediu a feirante Dalva Maria de Araújo, 74.

Estilo musical característico da Região Nordeste, é a interpretação de canto e poesia por dois cantadores, os repentistas. Eles improvisam versos de repente, por isso o nome,  sobre variados assuntos e costumam se apresentar, com a viola nordestina ou pandeiro, pelas feiras e espaços populares.

Correio Braziliense Foto: Sara Lopes