Novo disco de Bebel Gilberto é mensagem de amor para o pai, João Gilberto

Bebel Gilberto sempre foi muito próxima de Miúcha, um dos nomes de destaque do clã Buarque de Holanda, que, além de sua mãe, era amiga íntima e confidente. Com seu pai, o mítico João Gilberto, criador da Bossa Nova com Tom Jobim e Vinícius de Moraes a convivência era menor, mas intensa.

A cantora cresceu com o som do violão de seu pai ressoando pela casa da família. "Nunca imaginei que aquilo que eu presenciava era tão importante", diz, achando graça. "Para mim, era só a vida acontecendo. Acordava, levava café e ele tocava violão. Era normal, fazia parte do meu cotidiano. Mas adorava ouvi-lo tocar seus exercícios de aquecimento todas as manhãs."

Do pai buscou absorver o máximo possível e se impregnar, pelo menos em parte, da imensa musicalidade. Esse sentimento só fez crescer, depois que o genial cantor, compositor e violonista baiano partiu, em 6 de julho de 2019, deixando a música popular brasileira mais pobre.

Quando decidiu reverenciá-lo com o João, Uma carta de amor ao pai, que chegou ontem às plataformas digitais, o fez tomando como referência dois discos icônicos do homenageado, o chamado álbum branco e o aclamado Amoroso. Mas na celebração ela deixa impressa sua personalidade, tanto na maneira de interpretar cada canção, assim como na escolha do acompanhamento.

Gravado no Reservoir Studios, em Nova York, com Guilherme Monteiro no violão, assumindo a nada invejável tarefa de substituir o próprio mestre, exalta Bebel.

Terna e comovente, a gravação de João revela tanto sobre Bebel quanto sobre o pai, cuja obra ela evitava visitar por desejo de trilhar o seu próprio caminho. "Eu pressentia que só conseguiria fazer isso quando meu pai não estivesse mais por perto", observa. "Agora, pode ser do meu jeito, com covers de músicas que nunca pensei que faria. Pela primeira vez, estou interpretando as músicas dele e revelando como elas realmente me marcaram. São canções que ouvi durante toda a minha infância, então foi uma escolha de repertório afetiva, não me prendi somente aos clássicos", complementa.

Do "álbum branco" foram pinçadas duas canções escritas pelo próprio João Gilberto. Uma é Undiu, muito influenciada pelos sons do Nordeste, toda em sílabas sussurradas". A gravação original tinha seis minutos de duração, mas a versão se resumiu a apenas a metade do tempo. A outra é Valsa, também batizada de Como são lindos os Youguis .

Também desse disco entraram Eu Vim da Bahia (Gilberto Gil), uma música que conecta a cantora à sua herança paterna; e É preciso perdoar, de Alcivando Luz e Carlos Coqueijo, lançado em maio como primeiro single do disco, e que ganhou clipe dirigido por Erich Baptista.

O repertório traz também clássicos como Chega de saudade e Ela é carioca (Tom Jobim e Vinicius Moraes), Você e eu (Carlos Lyra e Vinicius de Moraes), Adeus América (Geraldo Jacques e Haroldo Barbosa) e O Pato (Jaime Silva e Neusa Teixeira).

Nos acompanhamentos, Bebel contou com Guilherme Monteiro (guitarra acústica e programação), Thomas Bartlett (piano e melotron), Clark Glayton (trombone), Alex Sopp (flauta), Chico Brown e Keny Wollesen (percussão).

Correio Braziliense